"E ainda querem que eu elogie esse monstro"

É dia da cidade
Cidade cinza
Que falso acolhe
Não abriga

Cidade essa que dá esperança
Mas pense bem
Te mandaram não acreditar em estranhos
A esperança não é franca

A cidade faz mais um ano de merda
Cuidado, é um alerta
Presta atenção no que for fazer
Ande com medo, se não quiser morrer

É sempre bom relembrar
É linda, brilhosa e próspera
Pra quem tiver dinheiro
E onde se abrigar

Aos poucos você vira mais um
Ignora o mendigo
Joga a bituca no chão
Faz cara de mau, todo mundo é inimigo

Vai se acostumando
É normal passar a ser babaca por aqui
A gente até levanta da cama e sorri
Mas quando pisa na rua
Olha pra cima e cinza

Cuidado!
Estupros são sempre abafados
Gente aqui já morreu por ter celular barato
E agora, tem seringa com AIDS na mão de macho

Mas é lógico
É o pico dos milionários
Bairros ricos pra todo lado
No meio, a favela
Na mão o bicarbonato

Tão desigual quanto os próprios salários
Olhares feios de babacas ordinários
Desculpa o desaponte
Mas se você é mulher ou negro, tá no lugar errado

De brinde vem a asma
Sinusite, a bronquite
O mal estar e o medo
De bônus, um homem sem noção observando seu corpo
E ainda querem que eu elogie esse monstro

Comentários

  1. Perfeito.
    Sinto-me dúbio quanto a isso. A evidente satisfação pela arte e conteúdo, e a tristeza por constatar com mais clareza a realidade que sinto como bem a descreves. Em sendo homem de pele mais para clara, sinto. E observo que mulheres e pessoas com pele escura sentem ainda mais.
    Pretendo certamente sair da cidade, ir para o campo ou cidade sossegada de pouco tráfego.
    Imagino que moras em metrópole; por curiosidade, investigação de empatia inversa, tencionas morar em outro lugar que não nela?

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    1. O comentário saiu anônimo à revelia. É o Leonard, do Wordpress.

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